Avançar para o conteúdo principal

Cinco Homens





Cinco homens mais dois: António Crispim Borges da Ponte, clarividente e dinâmico edificador da urbanização do Cabo da Vila, espaço que une duas das cinco freguesias da Cidade, local onde se perpetuarão as placas toponímicas, e o proponente da merecida homenagem: o Presidente da Câmara Municipal de Ribeira Grande. Por despacho datado a 1 de Setembro de 2003.

Os cinco por ordem cronológica: Ezequiel Moreira da Silva (n. 17.08.1893, CRG / f. 26.07.1974, CRG),[1] Manuel Barbosa (n. 17.12.1905, MPD / f. 27.06.1991, SBA),[2] Jorge de Melo Gamboa de Vasconcelos (n. 08.11.1907, SPRG / f. 02.07.1995, HPD),[3] Manuel Joaquim da Silva Costa Leite (n. 21.06.1922, CVC / f. 21.10.2002, HPD)[4] e Edmundo Manuel Garcia Machado d’Oliveira (n. 01.10.1928, MRG / f. 11.08.1982, A).[5]
Na Ribeira Grande, porém, entre outras combinações usuais, deixando de fora as alcunhas que, como jocosamente o referiu ainda no século XIX Francisco Arruda Furtado, quem as não tem não perde pela demora, pois, ao fim de dez minutos já se pode gabar de ter pelo menos uma, são conhecidos simplesmente, e pela mesma ordem, por: Senhor Ezequiel, Dr. Barbosa, Dr. Jorge, Senhor Costa Leite, Padre Edmundo Machado ou Dr. Edmundo. Gravado nas inovadoras placas toponímicas consta, ainda pela mesma ordem: Poeta, Jornalista e Industrial, Advogado, Professor e Escritor, Médico, Político e Estudioso, Industrial e Maestro.

Do nascimento de Ezequiel Moreira da Silva, o mais velho dos cinco, ao de Edmundo Manuel Garcia Machado d’Oliveira, o mais novo, vão trinta e cinco anos. Foram os primeiros dois a falecer: Ezequiel em Julho de 1974, ia completar 81 anos no mês seguinte, na sua casa da rua do Ouvidor da sua amada terra natal, era filho de um encarregado do Posto Telegráfico Postal local, e Edmundo, filho de um ‘logista’, longe em Almada, perto da esposa Elsa, em 11 de Agosto de 1982, teria feito em Outubro cinquenta e três anos. ‘Lá, vai haver festa.’ Foi das últimas palavras que a esposa lhe ouviu dizer. O primeiro terá visto a luz do mundo na rua de São Francisco, Conceição, o segundo, possivelmente numa casa da rua de João d’Horta, na Matriz. São os únicos que estão sepultados na sua terra natal: no cemitério de Nossa Senhora da Estrela.
Dos restantes três, dois nasceram fora do Concelho e um na freguesia ao lado da então Vila: Manuel Barbosa, filho de um sapateiro natural da Lombinha da Maia, que veio acabar os seus dias numa casa do Cabo da Vila, nasce na rua da Arquinha em São Sebastião, em Ponta Delgada; Jorge Gamboa, filho de uma professora primária natural da Conceição, na altura a dar escola na Ribeira Seca, e de um ‘escrevente’ natural da Achada, nasce na rua do Tornino de Baixo, hoje rua de Madre Teresa, na Ribeira Seca; Manuel Joaquim Costa Leite, filho de gente que vivia das suas fabriquetas de manteiga, inicia a vida terrena em Castelões, Concelho de Vale de Cambra, Distrito de Aveiro. Estes três últimos sepultam-se fora da Ribeira Grande: Manuel Barbosa falece e enterra-se em São Brás de Alportel, Algarve, local de residência do filho Celso Barbosa, médico de profissão; Jorge Gamboa falece na rua do Frias, em Ponta Delgada e enterra-se no cemitério de São Joaquim; Costa Leite falece no Hospital do Divino Espírito Santo, em Ponta Delgada e vai enterrar-se no cemitério de Vila Chã, em Vale de Cambra.
Três de entre eles eram licenciados, dois tinham mesmo duas licenciaturas, um deles um mestrado e ia começar o Doutoramento, e o terceiro uma especialização: Manuel Barbosa cursou Direito e Histórico-Filosóficas em Coimbra, Edmundo Machado d’ Oliveira formou-se em Música em Roma e mais tarde tirou História na Universidade Clássica de Lisboa, Jorge Gamboa tirou Medicina em Lisboa. Ezequiel fez todo o Secundário, passando pelo celebérrimo Colégio Fisher, em Ponta Delgada (ao lado do cemitério de São Joaquim), e Costa Leite aprendera a ler, escrever e a contar ainda em Castelões ou já no Lordelo. Segundo a esposa.

Estes cinco homens tão iguais nas suas diferenças, mas tão complementares nas suas vidas, são como os cinco dedos de uma mesma mão. Viveram, no sentido mais lato e profundo do verbo viver, anos a fio no mesmo espaço, neste espaço: a Ribeira Grande. Quando Manuel Barbosa para aqui veio em 1948 procurar alívio da pressão dos esbirros da Polícia Política de Oliveira Salazar, já era então um quarentão casado e pai de três filhos: Helena e Jacinto haviam nascido em Coimbra e Celso em Cavadodo, na Guarda. D. Clarice, a esposa, natural de Lisboa, ficara a aguardar. Jorge Gamboa era então um destacado membro da Legião Portuguesa e do regime (como continuou coerentemente a ser pela vida fora), porém, podendo tê-lo feito, não inviabilizou a entrada de Manuel Barbosa no corpo docente do Externato Ribeiragrandense nem pouco depois na sua Direcção. Apesar de professarem credos políticos diametralmente opostos existia entre eles uma certa estima pessoal. Jorge era o médico da família Barbosa. Ezequiel, por seu turno, era um amistoso e bem sucedido cinquentão, um benigno e inflamado patriarca da terra; Costa Leite, um desconhecido na terra, iniciava a montagem da sua primeira fábrica; Edmundo um jovem seminarista no Seminário Diocesano de Angra.

É acerca destes cinco que me pedem para dizer algo nesta ocasião. Sobre Ezequiel já se referiram Ventura Rodrigues Pereira, Padre Edmundo Pacheco, António Valdemar e António Crispim Borges da Ponte. O três primeiros conheceram-no com bastante intimidade. Sobre Manuel Barbosa temos o que deixou escrito nos seus livros. Sobre Jorge Gamboa dispomos do que escreveu Ventura Rodrigues Pereira. Sobre Costa Leite temos o Padre Edmundo Pacheco e o que o Jornal de Notícias de Cambra publicou. Sobre Edmundo Machado de Oliveira temos o Padre Edmundo Pacheco e o Dr. Manuel Francisco Aguiar. Dos cinco, conheci de mais perto o Dr. Manuel Barbosa e o Dr. Jorge, entrevistei ambos longamente em 1983. Fui colega de comissão do Dr. Jorge nas comissões de toponímia e de Património. Alimentei uma amizade com o Senhor Costa Leite. De resto entrevistei pessoas e familiares e consultei alguma documentação e li o que sobre eles pude encontrar.Não pretendo repetir o que foi dito, nem sequer esgotar o tema, trata-se unicamente de um subsídio para as suas necessárias biografias.
[1] BPARPD, Baptismos, Conceição, Ribeira Grande, B 1893, fl. 32; APCRG, Óbitos; depoimento da Sr.ª D. Clarinda Coutinho, filha de Ezequiel Moreira da Silva.
[2] BPARPD, Baptismos, São Sebastião, Ponta Delgada, 1906, fl. 20. Sobre o óbito, o filho, Dr. Celso Barbosa.
[3] ACRCRG, Ribeira Seca, 1907, fls. 54-54v. Depoimento da Sr.ª D. Luisa Tavares, filha do Dr. Jorge Gamboa.
[4] Dados obtidos da esposa, D. Élia Costa Leite.
[5] APMRG, Baptismos, Matriz de Nossa Senhora da Estrela, 1928-193, fl. 57v.; APMRG, Óbitos, Matriz de Nossa Senhora da Estrela, lv. 13, 1978-1983, fl. 8v. Junto da viúva, Dr.ª Elsa Andrade.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

História do Surf na Ribeira Grande: Clubes (Parte IV)

Clubes (Parte IV) Clubes? ‘ Os treinadores fizeram pressão para que se criasse uma verdadeira associação de clubes .’ [1] É assim que o recorda, quase uma década depois, Luís Silva Melo, Presidente da Comissão Instaladora e o primeiro Presidente da AASB. [2] Porquê? O sucesso (mediático e desportivo) das provas nacionais e internacionais (em Santa Bárbara e no Monte Verde, devido à visão de Rodrigo Herédia) havia atraído (como nunca) novos candidatos ao desporto das ondas (e à sua filosofia de vida), no entanto, desde o fecho da USBA, ficara (quase) tudo (muito) parado (em termos de competições oficiais). O que terá desencadeado o movimento da mudança? Uma conversa (fortuita?) na praia. Segundo essa versão, David Prescott, comentador de provas de nível nacional e internacional, há pouco fixado na ilha, ainda em finais do ano de 2013 ou já em inícios do ano de 2014, chegando-se a um grupo ‘ de mães ’ (mais propriamente de pais e mães) que (regularmente) acompanhavam os treinos do

Quem foi Madre Margarida Isabel do Apocalipse? Pequenos traços biográficos.

Quem foi Madre Margarida Isabel do Apocalipse? Pequenos traços biográficos. Pretende-se, com o museu do Arcano, tal como com o dos moinhos, a arqueologia, a azulejaria, as artes e ofícios, essencialmente, continuar a implementar o Museu da Ribeira Grande - desde 1986 já existe parte aberta ao público na Casa da Cultura -, uma estrutura patrimonial que estude, conserve e explique à comunidade e com a comunidade o espaço e o tempo no concelho da Ribeira Grande, desde a sua formação e evolução geológica, passando pelas suas vertentes histórica, antropológica, sociológica, ou seja nas suas múltiplas vertentes interdisciplinares, desde então até ao presente. Madre Margarida Isabel do Apocalipse foi freira clarissa desde 1800, saindo do convento em 1832 quando os conventos foram extintos nas ilhas. Nasceu em 1779 na freguesia da Conceição e faleceu em 1858 na da Matriz, na Cidade de Ribeira Grande. Pertencia às principais famílias da vila sendo aparentada às mais importan

Moinhos da Ribeira Grande

“Mãn d’água [1] ” Moleiros revoltados na Ribeira Grande [2] Na edição do jornal de 29 de Outubro de 1997, ao alto da primeira página, junto ao título do jornal, em letras gordas, remetendo o leitor para a página 6, a jornalista referia que: « Os moleiros cansados de esperar e ouvir promessas da Câmara da Ribeira Grande e do Governo Regional, avançaram ontem sozinhos e por conta própria para a recuperação da “ mãe d’água” de onde parte a água para os moinhos.» Deixando pairar no ar a ameaça de que, assim sendo « após a construção, os moleiros prometem vedar com blocos e cimento o acesso da água aos bombeiros voluntários, lavradores e matadouro da Ribeira Grande, que utilizam a água da levada dos moinhos da Condessa.» [3] Passou, entretanto, um mês e dezanove dias, sobre a enxurrada de 10 de Setembro que destruiu a “Mãn”, e os moleiros sem água - a sua energia gratuita -, recorriam a moinhos eléctricos e a um de água na Ribeirinha: « O meu filho[Armindo Vitória] agora [24-10-1997] só ven