Rabo
de Peixe – IX
É
quase impossível falar das ondas da Ribeira Grande sem falar das malogradas ondas
de Rabo de Peixe. Isso é (quase bem) verdade para os surfistas mais velhos. Por
que será? Porque, com as irmãs do
Areal de Santa Bárbara, do Monte Verde e de Santa Iria, formavam o ‘quarteto’ dourado do surfing da Ilha. [1] Porque ‘entre os
surfistas de fora da Ilha, Rabo de
Peixe era sinónimo de boas ondas.’[2] Por
que razão foram à vida?
Provavelmente, porque o surf era (ainda na Vila de Rabo de Peixe, porventura,
já não tanto na cidade da Ribeira Grande) uma ‘brincadeira para entreter’ ‘os
meninos drogados da cidade de Ponta Delgada.’[3] Estava-se
(então) longe de reconhecer o valor económico das ondas.[4] Ainda assim, os esforços (frustrados) para as
salvar não iriam cair em saco roto. As entidades oficiais - locais, regionais e
nacionais -, passariam a ter (muito mais) respeito pelas ondas.
Onde se formam as ondas? E como? Rui Ponte, especialista à escala mundial do fenómeno do El Nino, assíduo das Poças e dos areais
da Ribeira Grande, gerado e criado aqui mas nascido nas Lajes do Pico, onde a
mãe fazia questão que os filhos fossem nascer, respondeu:[5] ‘Essa era uma bela conversa para um
passeio no areal de Santa Bárbara. Por e-mail é mais difícil. No entanto, e
tentando por poucas palavras, toda a ondulação é gerada localmente pelos ventos
à superfície. Depois, dependendo das suas características (comprimento de onda,
frequência de oscilação, etc..) pode dissipar-se localmente ou propagar-se por
longas distâncias. E consoante a idade e a distância de
propagação, pode tornar-se mais regular. As ondas que vêm rebentar no Areal,
bastante regulares, podem ser geradas a milhares de quilómetros! A
ondulação mais irregular, que se pode ver misturada com as outras ondas
regulares que fazem a delícia dos surfistas, é gerada localmente e não teve
ainda tempo de "amadurecer," é uma grande misturada.’[6]
E, continuando: ‘Essas ondas de superfície só sentem
o fundo quando estão perto da costa. O fundo não gera a onda mas modifica-a de
várias maneiras. Pode atrasar a velocidade de propagação, pode mudar a direcção
de propagação, pode ditar quando e como a onda quebra, etc. Aliás, a onda
quebra porque a crista sente menos o fundo e adianta-se aos poucos acabando por
"cair." A maneira como a profundidade varia junto à costa é muito
importante. Pedra ou areia pode ter influência na medida em que pode afectar as
variações de profundidade (pedra não mexe e é irregular, areia é outra coisa).’[7]
Por que razão há mais ondas no Norte? ‘Os ventos são, como já sabemos, importantes.
Mas, neste caso, não são os ventos locais que interessam. A maior parte das
tempestades no Atlântico Norte passam a norte dos Açores. Mesmo longe e não
influenciando o tempo nos Açores directamente, as ondas que elas geram vão
naturalmente ter maior energia nas costas viradas a norte. Julgo que é por isso
que há sempre mais ondas na costa norte. Mas o perfil de profundidade perto da
costa também tem importância porque influencia a direcção de propagação das
ondas e especialmente onde e como rebentam. Vai um mergulho? Era bom, era!’[8]
Que
há de (tão) especial nas praias da Ribeira Grande? Perguntei a Pedro Arruda, um esteta
das ondas que foi Presidente da USBA: ‘A
resposta mais simples é a qualidade das ondas.’[9] De que quadrante são as melhores? ‘Do Norte com vento Sul.’[10] O que te atrai nas ondas? ‘Costumo dizer que o Surf não é um desporto de acção mas de
contemplação… De facto passamos mais tempo sentados na prancha à espera da
onda do que em cima dela… e a esperar pelas ondulações, os ventos certos, a
hora da maré… são muitas as variáveis e a tua vida fica tomada pelos mapas
meteorológicos e pelas previsões…’[11]
Enquanto os desportos de pavilhão, para falar apenas destes, exigem
a construção de edifícios (normalmente) caros e de uma constante manutenção ainda
mais cara, os desportos de ondas precisam
(apenas e pouco mais) que deixem as ondas em paz.[12] Já
em 1995, João Brilhante tinha essa preocupação. Mesmo antes, já defendia (em
entrevistas e artigos de jornal) os areais (daqui) contra a selvática exploração
de areia. Luís Melo (primeiro em Rabo de Peixe, onde iniciou o ensino do surf)
a partir de 2001 defende as ondas de Rabo de Peixe e das Poças (os de fora
conhecem-nas por Piscinas).[13] O Alta Pressão, programa da RTP/Açores, a
exemplo do que já se fazia pelo continente, dedicou três edições (uma primeira
em 2004, uma segunda, em 2007 e uma terceira e última, em 2011) aos desportos
radicais nos Açores. Ao tratar também do surf, abriu caminho à divulgação
(portanto, à defesa) das ondas dos Açores. Luís Melo e Joana Cadete na primeira
edição, e Luís Melo e outros, nas restantes, foram cruciais na revelação de spots de surf em todo o arquipélago. Em
2008, a ASSM, de João Brilhante, de Paulo Ramos Melo, de Vasco Medeiros, de
Paulo e Luís Sousa, reintegrou no seu programa (já o havia feito em 1995) ‘campanhas de sensibilização e limpeza nas
praias bem como acções de formação.’ [14] O
mesmo havia feito e voltaria a fazer (Luís Melo e os seus companheiros) em Rabo
de Peixe. Em 2009, a perda da onda das Poças e das primeiras duas de Rabo de
Peixe, levou a USBA (para prevenir males maiores) a (tentar) ir à raiz do mal.
Para tal, organiza uma (tanto quanto
sei, um inédita) Conferência (que teve
lugar no Teatro da Ribeira Grande) intitulada: Em Busca da Onda Perfeita – Os
Desportos de Ondas e a Sociedade Açoriana: Perspectivas Económicas e
Preservação Ambiental para um Desenvolvimento Sustentado.[15]
A intenção era, como se pode depreender pelo título, além de discutir o valor
económico da actividade, a de (em primeiro lugar, e isso já havia sido tentado
antes) ‘identificar e classificar todos
os locais com aptidão para a prática dos desportos de ondas na Região.’ Querendo
ir mais longe, isso já era novidade, o levantamento serviria ‘de base para uma futura legislação
específica de protecção destes locais.’ Vasco Medeiros (que trocara a ASSM
pela USBA) apresenta o projecto.[16] Infelizmente,
‘acabaria por não se concretizar.’
Porquê? ‘Meteram-se entretanto outras
coisas pelo meio e nem todas as ilhas responderam ao nosso pedido.’ Explica
Vasco Medeiros.[17]
E nisto, em
2011, estala a polémica (desta vez também a nível nacional e internacional) em
torno das ondas (sobreviventes) de Rabo de Peixe. Porquê? ‘A ampliação do porto de pesca (…) pode
ameaçar uma das melhores ondas do arquipélago," alerta a (…) associação
SOS - Salvem o Surf.’ A acontecer o que pretendia o Governo e
(alguns) pescadores, seria uma nova catástrofe a somar às anteriores. O que já sucedera?
‘A baía
de Rabo de Peixe tinha a valiosa onda para os surfistas do arquipélago dos
Açores, uma onda de qualidade mundial. Essa foi estragada há cerca de uma
década com a construção do actual molhe.’ E avisam o que poderia vir a suceder com a obra pretendida: ‘(…) existe uma outra onda vizinha que está
em perigo, com o projecto do novo molhe.’ Disse Pedro Bicudo, presidente da
associação. Querendo salvar a
onda, propõem alternativas. Que (na
sua óptica) contentariam pescadores e surfistas: ‘O estudo da associação propõe, por
exemplo, que seja estudada a alteração da
implantação do novo molhe projectado, rodando-o a fim de permitir a escapatória
das embarcações e de não prejudicar o surf.’[18] Em Biarritz, França, Paulo Ramos Melo, responsável
pelo capítulo Açores da Surfrider
Foundatiom Europe, que reabrira – com João Brilhante -, em 2007 a ASSM,
defende aquelas (preciosas) ondas. No ano seguinte, 2012, em Março e em
Dezembro, numa última e desesperada tentativa de salvar o que restava daquelas fantásticas
ondas, desloca-se a Rabo de Peixe uma delegação de peso do surf nacional.[19]
Voltam a propor soluções de compromisso, no caso ‘como alternativa secundária,’ ‘defendem a construção de um recife artificial ao lado do quebra-mar, para que as
crianças possam aproveitar uma onda semelhante.’[20]
Em finais
desse ano de 2012, Tânia Sofia Lourenço Cale, que (a fim de fazer o seu estudo)
havia pedido a colaboração de Vasco Medeiros e de outros surfistas locais,
apresenta ‘O Surf como potencial produto
turístico nos Açores. Além de apresentar um (exaustivo) levantamento (bastante
comentado) de spots de surf em todo o arquipélago, entre os quais se destaca
Santa Bárbara, ‘a jóia da coroa,’
como aí é dito, prova por A mais B o valor económico das ondas dos Açores.[21] No
Verão de 2014, o documentário da americana Sachi Cunningham ‘Mar sem Fim,’ filmado na Ribeira Grande nos meses anteriores, é
apresentado no festival de cinema de surf
(Portuguese Surf Film Festival) da Ericeira.[22] ‘retrata as ondas
grandes [essencialmente a da Viola][23] da Ribeira Grande e [aborda] a História da chegada do Surf aos Açores.’
‘Carlos Garoupa, a sua família e Marco
Medeiros, são protagonistas.[24]
Apesar de todo o esforço, sem ter em conta o contributo dos surfistas ou
o aviso dos pescadores mais batidos naquele mar, o novo molhe é inaugurado naquele
mesmo Verão de 2014.[25]
E agora? Havia-se perdido uma batalha, mas
não a guerra. Em 2015, menos de um ano sobre a destruição da onda de Rabo de
Peixe, o Governo Regional manifesta intenção de subir um patamar no apoio que presta
ao Surf. Se, desde 2008, indo atrás do que fizera a Câmara da Ribeira Grande, o
Governo Regional investe nas competições, em 2015, quer proteger as ondas,
afinal de contas, elas são a matéria-prima
do Surf.[26] A mudança (pelo que se vê) deveu-se (em
parte) a Paulo Ramos Melo, da Surfrider Foundation Europe, Capítulo Açores, e a Fausto Brito Abreu, Secretário Regional.[27] Conhecido de Paulo, com um fraquinho pelo surf, fizera
a instrução primária numa escola de Rabo de Peixe, inaugurara as obras que
herdara do seu antecessor, mas quer mudar: ‘O
Governo Regional entende que a qualidade das nossas ondas para a prática
de surf é um recurso marinho com potencial económico e uma mais-valia ambiental.’[28] Promete-se (doravante) não esquecer as
ondas: ‘O objetivo é também, diz,
permitir "avaliar o impacto ambiental de futuras obras na orla costeira e
gerir conflitos entre diferentes atividades na utilização das áreas
marinhas.’[29] O mais
importante, destaca Paulo Melo, ‘é que se trata de uma ferramenta que
permite uma melhor tomada de decisão" quando o Governo regional
pretender construir um porto, um molhe ou outra qualquer infraestrutura na
costa de uma das ilhas.’[30]
No final, quando a informação estivesse trabalhada, seria ‘introduzida na plataforma online do
SIGMAR e poderá ser consultada por todos os interessados.’ Desta vez, passar-se-ia (ainda que a passo de caracol)
da intenção aos factos?
Lugar das Areias,
Vila de Rabo de Peixe – Ribeira Grande (continua)
[1] Testemunho de Luís
Melo, 8 de Abril de 2024. No Norte reinavam até sobre as pioneiras praias do
Sul.
[2] Testemunho de
Luís Melo, 12 de Abril de 2024.
[3] E no entanto, já
entretinha (através de Luís Silva e
outros, depois com Sérgio Rego e David Prescott) um grupo de jovens de Rabo de
Peixe e arredores.
[4] Testemunho de António Benjamim, 15
de Abril de 2015: O
testemunho de um surfista da primeira geração é eloquente: ‘Quando não dava em Santa Bárbara ou no Monte Verde, íamos a Rabo de
Peixe. Descíamos por um atalho de terra batida, junto ao Café Beira-Mar, aí
deixávamos muitas vezes as nossas coisas ao cuidado do seu proprietário
[Juvenal Medeiros – Bernardo, que me confirmou]. De volta da água, com fome, comia-se metade de um pão com queijo de
cabra e bebia-se uma laranjada.’ Testemunho de Cláudio Terceira, 15 de
Abril de 2024: Outro
surfista destes tempos, responsável pela introdução da modalidade em Rabo de
Peixe, ainda diz que ‘causou algum
escândalo, o facto de a malta se mudar à vista de todos ali mesmo diante da
igreja.’ ‘Isso foi falado pelo padre na igreja.’ Diz-me um natural da
terra.
[5] Rui Vasco Ponte,
investigador principal no departamento de Atmosfera e Oceanos da “Atmospheric
and Environmental Research, Lexingtion, Massachusetts (EUA), foi orador
convidado, e homenageado no 42-º ano de Cidade.
[6] Testemunho de
Rui Ponte, 2 de Abril de 2024.
[7]Testemunho de Rui
Ponte, 3 de Abril de 2024. Testemunho de Luís Melo, 8 de Abril de 2024: Há ondas para o surf e para
o bodyboard (normais) e ondas gigantes para os mais aventureiros: ‘No Norte: Dos Mosteiros a Santo António quando o mar está grosso aparecem algumas
muito boas. Só de mota de água. A de Santana. Entre a Viola e a ponta do farol
também surgem outras gigantes. Também só de mota de água. Quem primeiro surfou
a Viola, antes do Seabra, foi o arquitecto José Luís Pires dos Santos (já falecido).
Esteve na Terceira. No lado Sul. No Estradinho, primeiramente surfada pelo José
Seabra. E mais duas até ao farol de Santa Clara. Mais à frente, diante da
Moaçor.’
Testemunho de Vasco Medeiros, 23 de Abril de 2024: E há até além das ondas do
mar, as ondas artificiais, como as do Wake
Park, na Ribeira Grande, inaugurado em 2021.
[8] Testemunho de
Rui Ponte, 22 de Abril de 2024.
[9] Testemunho de
Pedro Arruda, 24-26 de Outubro de 2023. Há
diferenças entre as duas praias? ‘São
pequenas diferenças que têm a ver com o movimento dos fundos de areia. O Monte
Verde está mais aberto ao mar e costuma mudar mais ao longo do ano. Os areais
têm aquela barreira do morro de Santana que ajuda a fixar a areia e torna a
praia mais consistente em termos de ondas. Antigamente uma das melhores ondas
quando o mar estava grande mais de 2 ou 3 metros era a direita da piscina mas
desapareceu com a construção do molhe de proteção das Poças.’ É correcto dizer-se que Santa Bárbara está
mais adaptada a local de ensino de Surf e a do Monte Verde mais para quem já
aprendeu? ‘Depende ambas têm boas
condições tanto para aprender como para surfistas mais evoluídos depende da
ondulação. O sul é melhor para aprender e no norte em geral como tem mais ondas
e mais fortes e grandes já é preciso ter alguma experiência.’
[10] Testemunho de
Pedro Arruda, 24-26 de Outubro de 2023.
[11] Testemunho de
Pedro Arruda, 12 de Novembro de 2023. Hoje, dia 16 de Abril de 2024, com um
vento de NE fraco e uma ondulação Norte, para as Poças – defronte da boca da
ribeira Grande, às 9, vi enquanto fazia o meu ‘surf’ de areia, entrarem dois
surfistas, às 17, quando saí do trabalho, contei uma trintena de surfistas. Da
janela do meu gabinete no Teatro da Ribeira Grande vi todo o dia gente na água. E quanto a nomes? Quando chegam à Ribeira
Grande vindos do Sul, sobretudo de Ponta Delgada, os surfistas (da primeira
geração, os da segundo já começam a segui-los) (para se orientarem) atribuem
novos nomes às praias da Ribeira Grande. Ao Areal (ou Areia) dão o nome de Monte Verde. No seu interior,
identificam ‘spots/locais.
No Monte Verde:’ Espinafres (spot que
vai desde o biscoito do Bandejo à ribeira da Ribeira Seca); Meio da Praia
(entre as duas ribeiras); Moinho e Direita das Piscinas. Testemunho de Luís
Melo, 14 de Abril de 2024. Hoje, dia 16 de Abril de 2024, com um vento de NE
fraco e uma ondulação Norte, para a zona do Tuká, vi, no meu regresso a casa,
uma meia dúzia na água e dois de bodyboard a dirigirem-se para a água. Ao Areal
de Santa Bárbara chamam de Areais. Dividem-no também em quatro spots: Cantinho
do morro ou pico da Ganza; Meio da Praia (em frente à casa abandonada na rua da
Saúde); Fenda da água e TuKá Tu Lá
(as direitas). Quem são/eram estes
surfistas? No início, vinham do Sul. Ou eram de lá ou aí residiam. Entre os
naturais da ilha, muitos haviam estudado fora ou haviam ido estagiar fora.
Havia ainda os de fora da ilha, do continente português, alguns filhos de pais
da Ilha outros filhos de militares ou técnicos diversos que haviam sido
colocados na Ilha (por exemplo na geotermia da Ribeira Grande). Actualmente,
além destes, há muita gente proveniente de outros países. No caso da Ribeira
Grande, para além dos da primeira e da segunda leva de João Brilhante e de
Paulo Melo, há gente da América do Norte, do Brasil (nadadores-salvadores,
treinadores de surf, empresários da área. freesurfers e nómadas digitais), do
continente Português, da Europa. Independentemente de serem daqui ou de apenas
residirem aqui, reconhecem-se (ainda que só se conheçam de vista) como fazendo
parte de uma ‘vaga’ comunidade. No
entanto, ainda que conheçam bem o litoral, pouco ou nada conhecem do seu
interior (a História, os anseios, as tradições). Que conversam vocês (perguntei a Pedro Arruda) enquanto esperam pela
boa onda? ‘Depende de com quem estás
a surfar mas na maior parte das vezes são sobre … ondas…’
[12] Enquanto os
primeiros, exigem o pagamento regular de água, luz, salários dos funcionários,
o desporto das ondas, não.
[13] Testemunho de
Luís Melo, 14 de Abril de 2024. ‘Antes
das obras nas Piscinas, eu, Pedro Arruda e Hugo Valente escrevemos um artigo no
Açoriano Oriental. Para perceber o impacto da construção do molhe, fomos falar
com técnicos do gabinete responsável pelas obras. Foi-nos dito que o molhe
seria construído na terceira fase, a primeira seria o saneamento, seguir-se-ia
a construção da via litoral e só depois o molhe. Afinal, não foi bem assim.
Ninguém imaginou as consequências do pontão. Criou um areal, cobriu de areia os
fundos de pedra e a onda foi à vida.’
[14] Arquivo Ribeira
Grande mais, Empresa Municipal, Zonas Balneares, Pasta 113, Ofício da
Associação de Surf de São Miguel por parte de João Oliveira (Brilhante) (sede:
não diz ainda) dirigido ao Presidente da Câmara Municipal da Ribeira Grande,
Ricardo Silva, 10 de Janeiro de 2008, pedido de cedência de espaço para sede da
Associação. Considera (aí) que o
Concelho da Ribeira Grande ‘possui o
maior potencial da Ilha de S. Miguel para a prática do Surf, nomeadamente as
zonas de Calhetas, Rabo de Peixe, Santana, Santa Bárbara, Monte Verde e outras,
como por exemplo Maia (…).’
[15] Arquivo de Vasco
Medeiros, Relatório e contas 2009 da USBA. Testemunho de Pedro Arruda, 26 de
Novembro de 2023.
[16] Em Busca da Onda
Perfeita – Os Desportos de Ondas e a Sociedade Açoriana: Perspectivas
Económicas e Preservação Ambiental para um Desenvolvimento Sustentado. Arquivo
de Vasco Medeiros, Relatório e contas 2009 da USBA. ‘Elaborar um relatório, com
uma base de dados geográfica associada, que, distribuído pelas entidades com
competência na gestão da orla costeira, constitua um dos elementos base de
apoio ao exercício do Ordenamento do Território, sendo esta actividade por
exemplo identificada nos POOC´s. Estabelecer parcerias com entidades que
validem cientificamente a informação recolhida. Elaborar uma proposta de
diploma legislativo que garanta um estatuto e medidas de salvaguarda para a
protecção e conservação destes locais.’
[17] Testemunho de
Vasco Medeiros, 14 de Abril de 2024: A ideia era depois de ter tudo coligido, a
exemplo do que se passara na Ericeira, era tentar que fosse criado um
Decreto-Regional que protegesse os locais e as ondas. Lembro-me de que depois
disso, não sei quantos anos depois, fui sondado por uma espanhola que andava a
fazer um mestrado na Universidade dos Açores. Isso era sobre as ondas. Há
aquilo da Vizitazores feito pelo Luís Melo que talvez tenha em parte
aproveitado o que se conseguiu fazer de 2009 [Talvez seja, segundo me têm dito,
o que mais sabe de ondas].’ O Faial
mandou tudo, talvez a Terceira, de Santa Maria, não foi preciso pois eu
conhecia bem. Ficou em falta o Pico, parte de São Jorge, por exemplo.’ Num
balanço à acção da USBA, Pedro Arruda, comentou: ‘Naquela altura havia ameaças grandes em Rabo de Peixe (uma batalha que
se perdeu) e Santa Catarina na Terceira (uma batalha que se ganhou) e havia
também todas as questões de preservação de Areais e Monte Verde (batalhas que
estão no bom caminho mas que ainda em parte estão a decorrer).’
[18] Público, Lisboa,
7 der Março de 2011: Os membros da organização realizaram um estudo que
propõe alterações ao projecto-base do novo molhe. (…) Segundo o especialista em
Física Quântica do Instituto Superior Técnico, estima-se que o novo molhe crie
reflexões da ondulação e amplifique as correntes de retorno que irão
"estragar consideravelmente a onda.’
[19] ‘Rabo de Peixe foi uma das melhores ondas da ilha de São Miguel nos
Açores, ao largo da costa de Portugal. Infelizmente, os interesses da indústria
pesqueira, que é uma das principais indústrias da ilha, anularam o valor do
surf em 2000, quando a onda foi essencialmente destruída após a construção de
um quebra-mar que foi construído como parte de um porto de pesca. Segundo
a organização portuguesa de proteção ao surf, Salvem O Surf, nem tudo foi
perdido. Enquanto o pico principal no meio da Baía de Rabo de Peixe se foi,
outra onda apareceu à esquerda do porto, uma onda chamada “Police” que quebra à esquerda. Num comunicado de imprensa sobre o
tema, a Salvem o Surf afirma: “Esta nova
onda, uma sombra da onda anterior, ainda é considerada de boa qualidade e em
dias maiores pode atingir um tamanho que pode desafiar até os mais experientes
surfista." Para desespero dos surfistas,
porém, a onda que surgiu agora está em perigo. Os pescadores não ficaram
totalmente satisfeitos com o que foi construído em 2000 e estão pressionando
para ampliar o porto. Este novo desenvolvimento destruiria “Police”, outra onda
iniciante no porto, juntamente com a oportunidade de surfar dentro deste porto.
[20] A previsão é de que o porto seja construído
ainda este ano. [reportagem de Março de 2012] Se for possível chegar a um
acordo, os açorianos poderão proteger um recurso recreativo, o turismo de surf,
ao mesmo tempo que satisfazem as necessidades da indústria pesqueira.’ Mete-se
ao barulho a ‘Surfrider Europe –
capítulo dos Açores, o Guardião da Costa de Rabo de Peixe e a Salvem o Surf
estão empenhados com o governo local e autoridades responsáveis no
sentido de colaborar na criação de um plano portuário que respeite o valor dos
surf breaks locais para residentes e turistas de surf da zona.’ A organização portuguesa Salvem Our Surf
está a trabalhar com surfistas e associações locais para encontrar uma solução
adequada. O objetivo deles é convencer o governo a construir o quebra-mar para
que a onda iniciante fique inalterada.
[21] Tânia Sofia
Lourenço Cale, O Surf como potencial
produto turístico nos Açores, Dissertação apresentada à Escola Superior de
Hotelaria e Turismo do Estoril para a obtenção do grau de Mestre em Turismo,
Especialização em Planeamento e Gestão em Turismo de Natureza e Aventura,
Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril, Novembro de 2012, pp. 60-61:
‘Dada a sua localização geográfica, a RAA apresenta uma ondulação considerável
durante praticamente todo o ano, o que fomenta a procura da região para a
prática de surf. A praia de Santa Bárbara (conhecida também como Areais),
localizada na Costa Norte da ilha de São Miguel, é considerada pela União de
Surfistas e Bodyboarders dos Açores (USBA) 25 (A USBA surgiu em 2008 na ilha de
São Miguel e visa a promoção e o desenvolvimento dos desportos de ondas no
arquipélago, bem como a defesa e salvaguarda dos locais onde os mesmos são
praticados (Pedreira, 2009). como a “jóia da coroa dos desportos de
ondas dos Açores” (Coelho, 2011: 28). Os Areais são um beach break
com ondas consistentes onde se concentra a maioria dos praticantes de surf dos
Açores e onde tem lugar uma prova do campeonato do mundo de surf de
qualificação (WQS) (p.61) (Burguete, 2012; Aguiar, 2012). Por outro lado, a
Fajã da Caldeira de Santo Cristo, na ilha de São Jorge, é considerada um
“santuário” do surf e do bodyboard, proporcionando algumas das melhores ondas
do país e da Europa (Lusa, 2009). Na Terceira, localiza-se outra onda de grande
potencial e qualidade, a onda de Santa Catarina, considerada segundo vários
especialistas a melhor dos Açores para a prática do bodyboard e uma das
melhores de Portugal. É nesta onda que tem lugar o Azores Islands Bodyboarding
Festival, prova organizada pela Associação de Surf da Terceira (AST) 26 (A AST
surgiu em 2009 na ilha da Terceira devido à necessidade de defender os
interesses da comunidade local de desportos de ondas perante as ameaças que
existiam contra as ondas locais. Esta associação tem como objetivos a
preservação das ondas e o assegurar de condições de segurança e saúde pública
aos seus utilizadores (Leal, 2011).) e pela USBA (Leal, 2011).
[22] Jornal I,
Lisboa, 27 de Julho de 2014.
[23]Quem descobriu
aquela onda? Segundo o Testemunho de Luís Melo, 8 de Abril de 2024: ‘Quem primeiro surfou a Viola, antes do José Seabra,
foi o arquitecto José Luís Pires dos Santos (já falecido). Esteve na Terceira. No
lado Sul.’
[24] Revista
Municipal da Ribeira Grande, Maio de 2015, p. 31. Pedro Arruda autor de
uma História do Surf nos Açores (ainda inédita) trata do assunto e acrescenta
outros contributos.
[25] Mas ainda
restava uma derradeira onda que iria ser destruída com a construção da
protecção da arriba da costa.
[26] A Câmara da
Ribeira Grande a partir de 2001 apoia o surf, ainda que inicialmente o fizesse de
forma tímida e apenas para Rabo de Peixe, o que terá levado João Brilhante a
desistir da Ribeira Grande, e desde 2007de forma mais resoluta e aberta.
[27] Luís Silva Melo,
como me confidenciou, enquanto Presidente da AASB, também teve conversas com
Fausto de Brito e Abreu: ‘Só ontem [dia 2 de Maio de 2024] li
com calma a crónica de Rabo de Peixe. Interessante teres referido o Fausto.
Quando exerci funções na AASB falámos algumas vezes informalmente para tentar
alavancar a modalidade e dar um empurrão à protecção de zonas protegidas para a
modalidade. Nada que se compare com o que já tinha sido feito pelo
Brilhante, Pedro e Luís. Mas era mais uma tentativa. abraço, LSM.’ Testemunho
de Luís da Selva Melo, 3 de Maio de 2024.
[28] Seria isso só
para inglês ver? Parece que não (mas não
depende só dele): ‘Por isso, este
responsável não teve dúvidas em acolher a iniciativa e incorporá-la no
Ordenamento do Espaço Marítimo açoriano.’
[29] Para trás ficam
exemplos contrários, como a construção do porto de Rabo de Peixe ou do molhe da
Ribeira Quente, "que acabaram com duas das melhores ondas da ilha
de São Miguel.’ ‘O projecto é pioneiro e deverá estar
disponível ao público até final de Abril. Por enquanto,
a Surfrider Foundation continua a fazer a identificação das zonas de
elevado potencial para a prática da modalidade nas nove ilhas do arquipélago.
(…).’ Paulo Melo explica a metodologia do estudo: ‘Quando tiver
o levantamento [de actividades
diversas] feito, a Surfrider Foundation
pretende consultar todas as associações de surf do arquipélago para, em
conjunto, decidirem quais os pontos que se manterão secretos para o público
geral. O Governo regional e os cientistas terão acesso à informação mas
não os surfistas, "pois faz
parte da cultura do surf existirem 'secret spots', já que algum
segredo apela à descoberta."
[30] Entrevista de Carla
Tomas a Paulo Ramos Melo, Surfrider Europa capítulo Açores, Expresso, Lisboa, 7
de Abril de 2015: ‘A organização não-governamental de defesa do surf e dos
oceanos, criada em Malibu (EUA) em 1984, tem um núcleo nos Açores
desde 2011.
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