Retrato
Vimos (já) onde moravam os mortos, (agora)
vamos (tentar) ver onde moravam os vivos. Quem era aquela gente das Calhetas? Que
fazia para ganhar a vida? Vivia de rendimentos? Ou do seu
trabalho? Qual trabalho? Como vou poder saber
isso? Para (tentar) responder a
essas e a outras perguntas (que por certo virão enroscadas umas nas outras) vou ‘examinar’ (com cuidado) o retrato (escrito) feito pelos padres das
Calhetas.[1]
De que retrato se trata? Do Rol de Confessados de 1879. Um ‘instantâneo’ (narrativo).[2]
Um levantamento (completo) rua a rua,
casa a casa dos ‘fregueses’ de Nossa Senhora da Boa Viagem, do Lugar das
Calhetas. Para quê um Rol? Para ‘controle’
do ‘rebanho.’[3]
Daqui para onde vou?
Vou (como se ‘observasse’ a terra em
voo-de-pássaro) partir do (plano) geral para (depois) ir descendo (o olhar)
e ‘ver’ o que (me) possa ‘ajudar’ a
responder (de forma razoável) às perguntas que (acima) fiz. Com isso na ideia,
tentarei ‘arrancar’ (daquele Rol) a informação
(suficiente) para propor (o meu retrato) daquela terra em 1879.[4]
Provisório (como em tudo). O que vejo?
Seis ruas, uma estrada e duas Travessas.[5] Uma ‘comprida’ artéria (litoral) que (ao
longo do percurso) muda três vezes de nome: até ao porto é rua do Porto, do porto até à igreja é rua da Boa Viagem e da igreja por diante é rua da Boa Vista.[6]
Da igreja da Boa Viagem para Poente, a malha urbana aperta-se. Perpendicular (à
rua principal), correm a rua da igreja, a Travessa do Barroso e a Travessa da
Boa Viagem. A meio desta última, paralelamente ao caminho litoral e à estrada, há
a rua Central.[7]
Contando (uma a uma) as casas das seis ruas, uma estrada e duas travessas,
contei 182 ‘fogos.’[8]
Contando (um a um) os (seus) moradores, contei 741 ‘almas.’[9]
As (almas) com idade atribuída
superior aos sete anos, chegam às 587.[10]
Destas, 328 eram ‘mulheres e raparigas,’
e 259 ‘homens e rapazes.’ Abaixo dos
sete anos de idade, contei 154: 79 rapazes e 75 raparigas.[11]
Os maiores de sete anos (de ambos os
sexos), constituem 78% da população (total) das Calhetas. Os menores de
sete anos (de ambos os sexos), valem
cerca de 22%. O que faria (então) das Calhetas uma terra (bastante) de jovens.[12]
Tendo em linha de conta o número de casas e de moradores e as
suas ocupações, aquelas seis
ruas, uma estrada e duas travessas
não eram (de modo algum) iguais em importância. A rua de Nossa Senhora da Boa Viagem
(por exemplo) era (de longe) a mais importante de todas. Nela habitavam 223
almas em 59 fogos. Seguia-se-lhe a da Boa Vista com 184 almas e 37 fogos. A
terceira, em importância, com 151 almas e 38 fogos, era a rua do Porto. Essas
três ruas (espinha dorsal da primitiva via litoral), correspondiam a 73,6% do
total das casas e a 75, 3% das almas das Calhetas. A ‘Estrada Nova’ era a ‘rua’
menos populosa e com menos fogos. Tinha apenas 4 casas e 14 almas.
Daniel de Sá, em 1968, correu as Calhetas a recolher dados para uma
‘reportagem,’ vendo (então) os caminhos (que ali havia), escreveu: ‘são todos de terra batida e cascalho.’[13]
Terra sem luz eléctrica (também no-lo diz) só viria a tê-la (dizem-nos outros) a
partir do dia 22 de Julho de 1973.[14]
A estrada (dizem-me) foi (terá sido) ‘asfaltada’
na segunda metade dos anos cinquenta (1957-58). Couto Alves que, onze anos depois de Daniel, fez (ali) uma (nova) reportagem, confirma que ‘a asfaltagem de caminhos [e a água
canalizada] foram realidades bem patentes
nos últimos anos.’[15]
A rua da Boa Viagem foi (dizem-nos ainda) a primeira a ser asfaltada. Por volta
do ano de 1990, já não haveria (ali) ruas terreiras. A
rua Central e a Travessa do Barroso foram (no entanto) ‘calçadas.’[16]
Como seriam (então) as casas das Calhetas? Percorrendo
(hoje) as suas ruas, além da igreja e da casa do ‘Morgado’ (à primeira vista: setecentistas), só vi mais três
(próximas da igreja) que (pela ‘cara’)
poderão ou não vir ainda do século XVIII.[17]
Duas são de um só piso. E como seria o
resto dos 182 fogos do rol de 1879?[18]
No início do século XIX, John Webster, um americano que veio casar a S.
Miguel e que por aqui andou mais de ano, descreveu assim a casa rural micaelense:
‘quatro paupérrimos muros de pedra solta,
sem reboco (…) com cobertura de palha e sem divisões interiores.’[19]
O que diz (hoje) a memória oral das
Calhetas (que recuará aos anos trinta)? Confirma (basicamente) o que
Webster e outros haviam (já) dito.[20]
Em 1968 a situação não mudara (assim
tanto). O (novo) ‘retrato,’ ‘escrito’ por Daniel de Sá, não destoaria
(em muito) do que se poderia ver (por ali) em 1879. Escreveu Daniel: ‘Na maior parte dos casos, os lares não
passam de quatro paredes, muitas vezes por caiar ou, se pintadas, ostentando a
medo a cor enxovalhada por anos de exposição ao sol e às intempéries. E há
casas, muitas mesmo, onde vivem famílias em condições infra-humanas.’[21]
Que ocupações tinham as 741 almas das Calhetas? As mulheres (e
crianças com ‘tino e corpo para o trabalho,’
como se dizia) ajudavam (certamente) em
casa.[22]
Em maior número do que os homens, ocupavam
(no entanto) o último degrau da escala social. Sendo o primeiro (claro) ocupado
pelos homens. No topo vinha os ‘proprietários.’[23]
Pode (até) dizer-se que aquela terra (tirando alguns poucos marítimos) vivia (basicamente)
da agricultura. Pode ainda dizer-se que seria (quase) autossuficiente: tinha água
(salobra), barro, pedra, trigo, milho, uvas e vinha, laranjais, carne de porco
e de vaca, lã de ovelha, etc.. E o que não tinha podia (sempre) ir buscá-lo a locais
próximos: farinhas, madeira, telhas e sertãs à Ribeira Grande. Claro, haveria
outras alternativas, por exemplo: Fenais da Luz, etc.. Voltando aos proprietários. Quantos são os do Rol de 1879? Dezasseis.[24]
Onde moravam? Cinco na rua do Porto;
sete na Boa Viagem; três na rua da Igreja; três na da Boa Vista. E (por último)
um na travessa da Boa Vista. Como não
fossem (muito) além do trabalho ‘de dar ordens,’ os proprietários precisavam de
braços para executá-las. Havia (nas Calhetas) sessenta e sete camponeses
(mais um número indeterminado de
filhos com corpo e tino para trabalhar):
dezanove viviam na rua
do Porto, catorze na da Boa Viagem, dezoito na da Boa Vista, seis na da Igreja,
outros seis na Central, um na do Barroso e três na travessa do Barroso. Pelo
número, é fácil concluir: eram a maioria. Não eram (contudo) os ‘mais desafogados.’[25] Podendo (os camponeses) trabalhar tanto nas terras
(suponho) como ‘empregar-se’ em outras
(mais) tarefas relacionadas com os trabalhos ‘do campo,’ aparecem (parece-me) dois ‘trabalhadores,’ residindo, um na rua da Boa Vista, o outro
na travessa do Barroso. E quem haveria
de lavrar as terras? Seis lavradores: um (vivia) na rua da Boa Viagem, três
na da Boa Vista, um na da Igreja e (por último) um na travessa do Barroso. Os
lavradores (com os seus bois e carroças),
‘acartariam’
(também) quaisquer frutos tirados das terras, das quintas ou fosse o que fosse,
por exemplo, pedra ou madeira.
Além de terrenos de cultivo, as ‘propriedades’ (o rol não o especifica) incluiriam
(por certo) quintas e vinhas. A respeito de quintas (de citrinos ou apenas vinhedos)
havia (por ali) quatro quinteiros: dois na rua da Boa Viagem, um na da Igreja e
um na Estrada Nova. Onde ficariam as
vinhas e as quintas nas Calhetas? Em nesgas ao longo da beira-mar e (o
grosso) no biscoito. Ou perto dele. Dizem-me agora.[26]
Seria então? Não sei. Para levar os produtos da terra para fora ou trazer outros
de fora, na terra viviam sete ‘arrieiros:’
um na rua do Porto, dois na da Boa Viagem, um na da Igreja, dois na Central e
outros dois na travessa da Boa Vista.[27]
Para construir ou reparar casas, levantar muros (etc..), não faltava pedra nas
pedreiras, como já referi (em trabalho anterior), havia (também) cabouqueiros:
um na rua da Boa Viagem, dois na da Boa Vista, outro na travessa
da Boa Vista. Para ‘trabalhar’ a
pedra bruta que os cabouqueiros arrancavam às pedreiras, havia canteiros: um na rua do Porto e outro na travessa da Boa
Vista. Para construir com a pedra
retirada das pedreiras, ‘trabalhada’ ou
não pelos canteiros, havia seis pedreiros:
cinco na rua da Boa Viagem (a dois passos das pedreiras), um outro (a dois
passos das ruas anteriores) na da Igreja. As obras (claro, também) gastavam
madeira. Era preciso serrá-la, para isso havia um serrador. Morava na rua do Porto. Para trabalhá-la (destinada a
casas ou mesmo a barcos), um carpinteiro
morava na mesma rua. Para agasalhar ou enfeitar o corpo, era só ‘falar’ às duas tecedeiras da rua da Boa Viagem. Para roupa ou (também) mantas? Para ‘consertar’
ou fazer o calçado dos poucos que teriam posse para tal: dois sapateiros (também) na rua da Boa
Viagem.
Quem quisesse bebidas
(sobretudo quem não tivesse vinhas ou já houvesse gasto o seu vinho), e talvez
outros (mais) precisos (como petróleo, açúcar), mas não muito mais do que isso,
podia ir a um dos dois vendeiros da
rua da Boa Viagem.[28]
Ou (então) ia à rua seguinte, à da Boa Vista, onde havia outro vendeiro. Em
1879 (pelo menos) já havia quem (certamente ‘com olho’ para o negócio) tivesse aberto uma venda na Estrada Nova.
De facto, o trânsito de e a caminho do Poente e do Nascente (que antes se fazia
só pela estrada litoral) estava (agora) a passar para aquela nova via. Quem desejasse peixe ou mariscos, podia (sempre) comprá-los a três ‘marítimos’ e a um pescador da rua da Boa Viagem, e a um outro na da Boa
Vista. Havia quem fosse pelas portas vender peixe: morava um peixeiro na Rua da
Boa Vista (rua que ficava – relativamente -, afastada do porto). Claro, que
podiam (sem recorrer aos marítimos) ir ao calhau pescar ou apanhar marisco. Comia-se
(ali) também carne. A terra dispunha (igualmente) de um carniceiro na Rua da Boa Vista. No entanto, é (bem) possível que o
grosso da carne viesse do ‘porquinho’
que cada casa (ou muitas delas) criaria. Ou do galinheiro. Quem não tivesse um
moinho de mão (de cereais), entregava o grão ao moleiro. Ou comprava-lhe (ou
trocava) a farinha. Havia (ali) três
moleiros: um na rua da Boa Vista e dois na rua Central. Essa sua localização
(mais próxima dos Fenais) levanta a suspeita de que iriam primeiro aos moinhos
de vento de Santo António e Capelas (entre outros). Todavia, (em alturas em que
o vento não era propício) iriam aos (potentes) moinhos de água (dentro) da
Ribeira Grande. Onde aprendia aquela gente
os seus ofícios? As ‘domésticas’ (em casa) com as mães, madrinhas ou
irmãs mais velhas. Os camponeses, marítimos, pedreiros (incluindo toda a
mestrança) aprenderiam (de certeza) com os pais ou os com os mais velhos. Quem ensinava a ler e a escrever? Além
do padre? Havia (já ali) um professor. Chama-se António Luciano do Rego.[29]
Deveria dar aulas na sua casa da rua da Boa Viagem. Não tanto pela importância (social) mas por estar ‘próximo’ do padre e ‘governar’
a igreja (território sagrado), o sacristão Bento Soares de Sousa também reside
naquela mesma rua. Repito: a mais importante das Calhetas.
Quem seria (então) a pessoa mais importante do Lugar das
Calhetas? Aos olhos das gentes das Calhetas (pelo menos de grande parte delas, estou em crer), seria (sem dúvida)
o cura Inocêncio de
Almeida Cabral (1874 a 1879).[30] No
entanto, estaria a léguas do poder que (até certa altura) dispôs o (influente) padre Tomás de Sousa Estrela (1837-1874).[31] Em
1878, oficialmente,
o padre do Pico da Pedra era (deveria
ser) a figura mais importante das Calhetas.[32]
Ou seja: Francisco José do Amaral e Melo (igualmente) Presidente da ‘Freguesia de Nossa Senhora dos Prazeres do
Lugar do Pico da Pedra.’ (repare-se que caíra já Calhetas do nome da
Freguesia) E o (poderoso e prestigiado) Regedor António Augusto da Mota Frazão (Pico da Pedra, 10.04.1809 - Pico da Pedra - 9.04.1892).[33]
Face à alteração na secretaria (de 180 graus) do seu estatuto, (o ‘Morgado’ Manuel de Medeiros Bettencourt Melo falecera em 1860 e o Padre Estrela
saíra em 1874), as Calhetas terão (relutantemente ou
não) aceitado a (nova) situação.’[34]
Ou resignaram-se? Se assim foi ou não, ainda não consegui saber, nem sei se
alguma vez o saberei, o que (já) sei é que em 1907, por se terem certamente desiludido,
a questão do estatuto tornara-se (há algum tempo) importante: ‘Sabe-se que se
publicará breve o decreto criando paróquia autónoma do lugar das Calhetas, que
tem sido curato sufragâneo do Pico da Pedra. Satisfaz-se assim a uma reconhecida
necessidade e antiga aspiração daqueles povos.’[35]
(continua)
São Brás (Ribeira Grande)
(Correio dos
Açores, 3 de Junho de 2023)
[1] Ao contrário das
Calhetas e de Rabo de Peixe – apenas para as freguesias a poente da Ribeira
Grande, os Róis do Pico da Pedra ‘levaram – infelizmente -, sumiço.’ Com dano
da sua memória e da sua História. E o Pico da Pedra que tem o bom hábito
preservar a sua memória: no melhor pano cai (também) a nódoa?’
[2] É o primeiro
livro (sobrevivente) que se encontra no Arquivo Paroquial da igreja de Nossa
Senhora da Boa Viagem. A série (sem lacunas) vai até finais da década de vinte
e (menos completa) até à década de quarenta. Claro,
tendo em conta alguns limites: as idades não são (necessariamente) exactas e a
sequência das casas não segue a dos números de polícia.
[3] Com penas (multas e até prisão) que recaíam sobre quem (não
tendo quaisquer atenuantes) não a tivesse cumprido.
[4] Para chegar um
pouco à resposta (ou respostas), teria que cruzar a informação do Rol com a dos
assentos de baptismo, casamento e óbito. O que não vou fazer aqui. No entanto, por mais que me esforce, será um (primeiro) retrato
‘incompleto:’ nada há no Rol que me
diga como se divertiam ou sofriam (por exemplo).
[5] Tudo de chão de terra batida. Dizemo-lo mesmo sem
documento que nos diga isso? Sim, e com toda a probabilidade de ter sido assim.
Basta ler autores tais como Luís da Silva Ribeiro, Francisco Carreiro da Costa
ou Luía Bernardo Leite de Ataíde. Basta ainda recordar as conversas com os mais
velhos.
[6] Era essa a via de ligação tradicional da parte
Nascente do Concelho da Ribeira Grande com os Fenais, Capelas, Santo António e
por aí adiante em toda aquela banda da costa Norte da Ilha de São Miguel. É a
artéria mais densamente povoada. E a mais importante. A partir de finais da
década de sessenta, traçou-se uma nova via paralela (alternativa à primeira),
construída dentro de terra: a Estrada
Nova. Que ligava os pontos da anterior. Ainda escassamente povoada (tal
como sucede ainda hoje). Já lá havia, contudo, uma venda. E umas poucas casas.
[7] Observação e
conversa hoje (dia 27 de Maio): a rua Alexandre José Moniz (que se segue à
Travessa da Boa Vista é recente. Antes haveria uma canada. É uma rua recente. O
alargamento da canada (anterior), era o caminho que tomava a esposa do sr.
Alexandre, foi possível graças à oferta do terreno por aquele senhor. Daí que
lhe deram o nome. E também pelo terreno do cemitério e pela imagem. Como vimos
anteriormente. Se se retirar a Estrada Nova e a
Rua Central, visto do alto, o que se vê parece o desenho (rudimentar) de uma
‘escova’. O cabo segue a linha de costa, enquanto o pente de três dentes,
perpendicular, dirige-se da costa à Estrada Nova.
[8] Que era (então) um fogo? Uma casa moradia.
[9] O Rol de 1879
não atribui idades, pelo que fico sem saber se inclui ou deixa de fora deixa de
fora crianças de certa idade. Como acontece noutros.
[10] Aí não se diz mas deveriam ter mais de sete anos de
idade.
[11] Conclusão (possível)? Em 1879, havia (nas Calhetas)
mais mulheres e raparigas (54, 4% do
total) para (45,6%) de homens e rapazes.
[12] E se lhes acrescentássemos (ainda) as almas até aos 14
(que o rol de 1879 não identifica), a percentagem seria (bem) maior. Suponho.
[13] ‘Calhetas. A mais pobre do concelho: Aqui não
morre a Esperança! Inquérito do
Açores às Juntas de Freguesia, Açores, Ponta Delgada, 16 de Março de 1968,
pp.1, 3 Mas
(disse-lhe o Presidente da Junta), já se pensava ‘na abertura da Travessa Alexandre José Moniz (…) na abertura duma
artéria que ligaria a rua da Boa Viagem à Estrada Nacional (…) na conclusão da rua do cemitério bem como o
conserto da rua da Saudade atá ao outeiro da Égua.’
[14] Nota avulsa: Livro
de Visitas Pastorais de Nossa Senhora da Boa Viagem [s.d.]: ‘No dia vinte e dois de Julho de mil
novecentos e setenta e três às 20 horas e trinta minutos com a presença das
autoridades concelhias e distritais, foi inaugurada solenemente a luz
electrica, com bênção ritual, ficando a igreja e freguesia, esplendidamente
iluminada, em grande festa.’
[15] Alves, F. Couto,
Calhetas, Açores, Uma Terra, uma
Gente, 6 de Dezembro de 1979, p. 8.
[16] Testemunhos de
Mestre Carlos e Aristides Travassos, 30 de Maio de 2023. Talvez por serem as ruas dos
homens da pedra?
[17] Rua de Nossa
Senhora da Boa Viagem, n.º 16, n.º 18 e uma outra (sem número) ligeiramente
defronte. Esta última tem uma alminha (já quase ilegível) no cimo da qual, na
pedra, uma data: ‘1743.’ Em J. M. Santos Simões, Azulejara nos Açores e na
Madeira, [década de sessenta século XX] p. 83. Aí é (erradamente) arrumada nos
Fenais da Luz. Uma nota de Hugo Moreira afirma que a casa é tipicamente
oitocentista.’ Não sei. Num lintel da casa do Morgado está inciso uma data:
1753.
[18] Na ausência de fotografias ou de quaisquer outros
registos de imagem, resta-me reler alguns (bons) estudos sobre casas rurais.
Encosto-me ao que escreveram Arruda Furtado, Carreiro da Costa e Luís da Silva
Ribeiro. E tento-o aplicar às Calhetas.
[19] Costa, Francisco
Carreiro da, Etnologia dos Açores, volume 2, Lagoa, 1991, p. 431. Umas tinham chaminé. Outras não. Umas tinham cozinha
dentro de casa. Outras, fora, no quintal. Chão de terra batida. Uma porta às
vezes nenhuma janela. Não havia vidros. Um quintalinho com o que a panela
precisava. Talvez um curral de porco. Talvez galinheiro. A escuridão rompia-se
com o uso de candeias.
[20] Fui falar com
gente antiga das Calhetas, que no geral, com algumas diferenças, o confirmaram:
Testemunho de Maria Carmen Pinheiro Dias, 18 de Maio de 2023 (Não sabe se
nasceu no Pico da Pedra ou nas Calhetas, vai fazer 88 anos em Novembro e veio
para as Calhetas com 9 10 anos. Portanto, em 1946 ou 1947. Maria Carmen Pinheiro
Dias (87 a caminho dos 88): ‘Muitas casas eram de pedra sem ser caiadas.
Já tinham telhas. O chão era terreiro. Nem todos tinham galinhas e porcos. Os
que tinham, deitavam as galinhas para a rua. Caminhos de terra.’ A Sr.ª Antuérpia (nos oitenta anos de vida): ‘No meu tempo já não conheci casas de palha.
Mas as paredes eram de pedra sem ser caiada. E o chão era de terra batida. A
cozinha era dentro de casa. No quintal tínhamos tudo: curral, galinheiro.’
[21] ‘Calhetas. A mais pobre do concelho: Aqui não
morre a Esperança! Inquérito do
Açores às Juntas de Freguesia, Açores, Ponta Delgada, 16 de Março de 1968,
pp.1, 3
[22] Tratavam de tudo de portas para dentro: cozinhavam,
tratavam dos filhos, dos animais. Fora de portas, trabalhavam nas (muitas e
duras) ‘lides agrícolas:’ apanha de
uvas, de laranjas, esgalhar milho, etc.. Algumas iam (podiam ir) ao calhau.
Eram (de longe) a maioria da população.
[23] O Rol não diz, mas (por outras fontes) sabe-se que eram os que possuíam propriedades. Era gente que vivia (sobretudo) dos seus rendimentos.
[24][24] Acrescente-se (porém, apesar de nem sempre vir
expresso) mais os filhos que os ajudariam. Aliás, isso aplicar-se-á às
ocupações que vou (abaixo) referir.
[25] Trabalhavam de sol a sol em terras: alguns (presumo) fariam um ou outro bocadinho de terra seu, porém, (a força deles) trabalharia em terras de outros.
[26] Maria Carmen
Pinheiro Dias: ‘da canada do Tanque para cima havia quintas;’ Aristides
Travassos 58 anos) – 28 de Maio de 2023: ‘Quintas na canada do Arrã – canada do
Morgado para cima.’ Vinhas: Canada da Terça e Biscoito.’
[27]
https://dicionario.priberam.org/Almocreve (Indivíduo condutor de bestas de carga (em viagens periódicas ou não)
"Almocreve", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em
linha], 2008-2021, https://dicionario.priberam.org/Almocreve [consultado em 28-05-2023].
[28] Por certo (por ter mais casas, mais gente importante e
mais serviços), era (repito) a rua mais importante das Calhetas.
[29] Quem era?
Rodrigo Rodrigues identifica um António Feliciano do Rego Calisto (não sei se
era essa), nascido nos Fenais da Luz a 11.8.1838. Casou a primeira vez no Pico
da Pedra, a 1.9.1862, com Filomena Augusta Pimentel, filha de Francisco
Pimentel e Rita Martins. Casou a segunda no Pico da Pedra, a 5.7.1871, com
Antónia Guilhermina Botelho, filha de Manuel José Botelho e Maria Isabel. Teve
do 1.º casamento: 12 - Manuel, nasceu nas Calhetas a 11.1.1865. Foi para o
Brasil. Será ele?
[30] A Semana,
Ribeira Grande, 15 e Outubro de 1910, p. 2. BPARPDL, Alvim, Alexandre de Sousa,
Projecto de Dicionário de Eclesiásticos, Inocêncio de Almeida Cabral Era
natural da Ribeirinha, curato de Nossa Senhora da Estrela. Segundo Alexandre
Alvim, seguindo o que o capelão José Augusto da Costa Feio lhe informara,
diz-nos que fora ‘Cura em Achete,
Concelho de Santarém; passou a capelão da Senhora da Saúde, dos Arrifes; passou
a Cura da Senhora da Boa Viagem, das Calhetas, e passou a Cura de Santo
António, do Lugar do mesmo nome. Hoje (1893) é manente e faz parte da ordem a
que pertencem os padres Franceses do Instituto Fisher, que julgo ser a ordem do
Espírito Santo. É irmão materno (somente) do Cura José Lucindo da Graça. Depois
de ser Cura no Achete e antes de ser capelão nos Arrifes, foi Capelão da
Infante D. Isabel Maria, cerca de 15 anos. Está morando ainda (1896) na
Ribeirinha. Informação do arquivo do Dr. Eugénio do Canto. Cura de São Brás em
1910; já o seria no século XIX?’ Terá celebrado ‘a sua primeira missa a 14 de Outubro de 1860.’
[31] Alegara (para
isso) motivos de saúde, no entanto, a sua decisão poderá ter (sobretudo) a ver
com assuntos de natureza bem mais melindrosa. AJFPP, Livro de actas da Junta de
Paróquia da igreja de Nossa Senhora dos Prazeres do Lugar do Pico da Pedra e
Calhetas, 1 de Julho de 1858 – Setembro de 1873, sessão de 17 de Novembro de
1862, fls. 22 v. O Presidente Padre Francisco de Amaral e Melo o Padre Tomás de
Sousa Estrela. O vogal José Joaquim Cabral. O cura era o dono e senhor da chave que tanto
podia abrir como fechar a porta mais ambicionada: a do céu. Inocêncio
(natural da Ribeirinha, curato da Matriz da Estrela) (nas Calhetas) morava na rua da Boa Viagem. Com ele viviam a tia
Teresa Ermelinda e o criado Manuel. Realizavam todos os ritos da Santa
Igreja Católica. Eram catequistas e muito provavelmente (antes da chegada do
professor. também ensinavam as primeiras letras).
[32] Apesar de (crer) identificar dois vogais da Junta de
Paróquia (talvez) ligados às Calhetas. Seria gente que aceitava a situação?
[33] AJFPP, Livro de
actas da Junta de Paróquia desta Freguesia de Nossa Senhora dos Prazeres do
Lugar do Pico da Pedra, 10 de Julho de 1878 – 29 de Agosto de 1880, sessão de
14 de Julho de 1878, fl. 4: Presidente Padre Francisco José do Amaral e Melo,
vogal António Jacinto de Almeida, vogal António Luciano do Rego Calisto, vogal
Manuel Soares de Sousa Pereira, vogal José Tavares Pacheco, Regedor António
Augusto da Mota Frazão. O secretário da Junta: Manuel Tavares Labão. Vieira,
Tomás Quental Mota, Recuperar
urgentemente uma casa histórica no Pico da Pedra, Diário dos Açores, 1 de
Junho de 2023, p. 9. Fora o porta-voz para a
água, chegara a reitor do Liceu, nas décadas de sessenta e ainda na de setenta
fora vereador da Câmara da Ribeira Grande.
[34] BPARPD, Óbitos N. S. Boa Viagem, Calhetas. 11 de Abril de 1860, fl. 58
[35]
Persuasão,
Ponta Delgada, 17 de Julho de 1907, p. 3
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